domingo, 17 de maio de 2009

A Escolha de um Projeto de Avançado - parte II

Que características se deve procurar em um professor orientador? Acho que isso depende das motivações de cada um. Tem gente que acha indispensável um orientador pai, uma pessoa legal com o qual você possa conversar sobre qualquer coisa e, talvez, se tornar amigo. Outros talvez queiram um orientador rígido, que os faça trabalhar bastante de forma a extrair o máximo de si mesmos. Ou, quem sabe, uma pessoa tranqüila, que não vai te dar muito o que fazer, mas vai te dar 10 no final do semestre.

Naquele mesmo dia, o querido professor disse, enquanto o cachorro mordia, deitado, seu brinquedo-de-morder, que "o orientador é tudo; como fulado disse, o orientador é o upper-bound de onde você pode conseguir chegar".

Várias vezes me vi pensando sobre o quanto isso pode ser verdade, no meu caso. Minha opinião tende para o lado de que talvez a partir do doutorado isso possa ser verdade. Mas, na Iniciação Científica? Minha experiência tem sido de que o professor passa sérios apuros em encontrar algo que você possa estudar, que não seja ininteligível diante do seu quase total desconhecimento de Física*. De modos que, a meu ver, a Iniciação Científica em Física consiste em você estudar uma série de disciplinas e alguns poucos tópicos com o objetivo de torná-lo capaz de estudar um tema no futuro, muito mais do que estudar o tema em si. Tudo bem, você pode estudar seu tema de vez em quando, mas acredite-me: é bem provável que você gaste um bom tempo estudando coisas acessórias até conseguir entender aquele texto que seu orientador te mandou ler... Ou talvez só entenda no ano seguinte, depois de ter feito uma certa disciplina.

É claro, estou exagerando as coisas, mas esse é um ponto importante, e vou discutir * com calma mais tarde. Mas, adiantando: no começo, me vi em séria desvantagem diante dos alunos da Física, que desde o começo estudaram Física de um modo mais correto (a meu ver) , em várias disciplinas boas e ruins, mas sem omitir passagem alguma. Conto apenas minhas experiências, e elas dizem: as coisas fora do CM (o mundo real) tem complicações outras. Eu adoraria dizer que é mais difícil do que o Ciclo Básico do CM, mas isso seria levar para o lado pessoal. As coisas só funcionam diferente: os professores não conhecem você; você não pode negociar datas de provas; se todo mundo foi mal em uma prova, isso é apenas um fato, não vai ser criada uma sub sem mais nem menos para ajudar todo mundo; etc. Me vi em desvantagem em relação aos alunos da Física simplesmente porque eles estavam há dois anos acostumados com tudo isso e eu não. É um choque cultural inevitável quando você foi mimado pelo CM e, de repente, vai parar em um instituto onde as coisas já estavam andando há muito tempo.

Mas voltando à questão do professor orientador. Todo mundo passa pela incômoda fase de se conversar com possíveis orientadores ("modo 2"), ou, antes, com pessoas para indicar possíveis orientadores ("modo 1"). Neste ponto da história, eu já fiz isto, e falta fazer aquilo. É, tem também aqueles professores com o qual você conversa mas não tem intenção especial de fazê-lo seu orientador ("modo 3"). É bom pra fazer você conhecer coisas novas, e te orientar (ou confundir) se você estiver indeciso. Olhando agora, vejo que conversei com muito poucos professores, e esse terceiro caso só ocorreu com pessoas me arrastando, ops, me convidando a ir conversar junto. Acho que não gosto da sensação de conversar, além do que sou muito objetivo. Se eu, por decisão própria, fui conversar com professores, em modo 2, houve sempre, de início, mais de 70% de chance de fazê-lo meu orientador.

Então entrei no site do prof. X. Tem uma foto dele, todo calmo e plácido, diante duma lousa, com fórmulas escritas. Quando vi a foto, pensei na hora: "Olha! Que professor legal!". Mandei um e-mail (aff, como era horrível escrever aquelas coisas) contando a situação e pedindo para agendar um horário para conversar. Ele respondeu brevemente, marcando um horário e acrescentou: "traga o seu histórico".

Achei essa história de histórico no mínimo curiosa, e pensei: "vou pedir para o Ne... ops, secretário, preparar não um, mas dois históricos". O secretário achou estranho: "Pra que você quer dois históricos?" Respondi algo como: "Ah, não, são uns projetos pessoais. Quem sabe eu precise de mais depois."

Fui até o departamento do professor X, e após horas perdido entre avenidas e ruas de corredores, procurando nomes em plaquinhas nas portas, finalmente achei a sala do professor X. Bati, e me mandaram entrar...

A sala era enorme, e tinha uma mesa com um professor no canto. No amplo espaço vazio, dava para umas 10 pessoas fazerem ginástica.

Nos apresentamos brevemente, ele perguntou: "Trouxe o histórico?" Eu: "Sim, aqui." Ele guardou sem nem olhar. Ou melhor, fazendo um forte esforço para lembrar agora, acho que ele olhou só para o alto da primeira página, creio que para verificar se estava escrito "Histórico Escolar".

Ele disse: "Para você saber se vai se interessar por supercordas ou não, a primeira coisa que precisa fazer é ler o livro U, de B. Enquanto você não ler esse livro, não podemos falar em Iniciação Científica. Leia esse livro, e quando tiver passado pelo menos da metade, volte a falar comigo". (Eu só não coloquei o nome do livro porque it would give away the identity of the Professor... Ele fala isso pra todo mundo! Para aqueles que pedirem, digo sem problemas que livro é.)

O que eu poderia responder? "Tá bom." E, um pouco atordoado, sem saber direito o que fazer, me despedi. Devo ter passado uns 5 minutos falando com o professor X.

Fiquei matutando: "Caramba, encontrei um cara igualzinho a mim. Mas caramba, tudo tem limite! Como é que vou passar dois anos com um cara assim tão..."

Fui conversar com um ex-aluno do CM, que, segundo minhas espio... ops, olhadas pela wiki e, mais importante, nos arquivos com livre permissão de acesso há muito tempo esquecidos no apostol e no proccm, tinha feito Iniciação Científica com o professor X. Hoje ele faz doutorado com o professor X.

Reclamei com ele: "Ah, ele me mandou ler um tal de livro U. Você conhece esse livro?" - "Sei. Já vi esse livro, é um livro de divulgação científica. Mas acho esse livro muito chato, nunca consegui ler além das primeiras páginas." - "Passei só uns 5 minutos falando com ele, e ele disse que..." - "Você teve até sorte. É normal dele. Quero dizer, ele já passou 45 minutos discutindo comigo uma única passagem em uma conta que eu tinha feito uma vez, mas nunca tive uma conversa não-acadêmica com ele."

As it turns out, na época achei o livro U muito chato, e não consegui passar das primeiras páginas. Mas, no começo deste ano, li avidamente o livro U, até mesmo em detrimento de coisas que precisava estudar. Achei o livro fantástico, e o recomendo muito. Foi com ele que finalmente entendi a Relatividade Especial. Se A se move em relação a B, B chega à conclusão de que o tempo passa mais devagar para A. E ele está certo. Por outro lado, podemos dizer que B é que se move em relação a A. Nesse caso, A chega à conclusão de que o tempo passa mais devagar para B. E ele está certo. Estão ambos certos, e não há contradição alguma nisso. Também aprendi pela primeira vez que todas as partículas do Universo estão sempre, absolutamente sempre, se movendo à velocidade da luz pelo espaço-tempo (apesar de ter visto isso recentemente no curso de FMT0421 - Relatividade Restrita, esse fato peculiar teria me passado despercebido, não fosse pelo livro, visto que, digamos, os cursos não costumam dar ênfase em certas coisas que não são contas, ou em como contar a história). E também entendi finalmente um negócio que eu não entendia de jeito nenhum: por que raios a quantização resolve a catástrofe ultravioleta. E entendi isso em termos de moedinhas que adultos precisam jogar para crianças em um calabouço. Enfim, é um livro que eu recomendo.


A seguir: o professor Y.

Um comentário:

  1. Hey Léo.
    O que você fez com o outro histórico?
    O último parágrafo é meio difícil de entender para leigos, mas eu juro que me esforcei pra tentar.
    Quando você encontrou o professor, você disse que finalmente tinha encontrado alguém como você; será que sua sensação foi a mesma que eu tenho quando falo com você?
    Beijo.

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